Covid-19: psicóloga sugere participação da criança na elaboração de sua própria rotina

11/03/2021 - Ana Clara Cabral

Saiba como cuidar da saúde mental das crianças durante o isolamento social ocasionado pela pandemia

Após cerca de um ano convivendo com uma pandemia e cumprindo isolamento social rígido pela segunda vez, o cuidado com a saúde mental das crianças deve ser ainda maior. Elisabete Viana, pedagoga e psicóloga clínica especialista em Gestalt terapia da infância e adolescência e terapia sistêmica, fala sobre o impacto da pandemia na vida das crianças.

Mudança de rotina

A psicóloga explica que o maior impacto na saúde mental das crianças se dá principalmente por conta da mudança na rotina, devido ao isolamento social, importante medida de contenção do vírus. “As crianças perderam na pandemia o espaço onde transitavam, brincavam. Não podem mais encontrar os colegas, professores, e a questão da saúde mental está muito ligada às interações sociais durante a infância. Se ela não consegue interagir, construir aprendizados com essas trocas e fica confinada em casa, muito voltada aos aparelhos eletrônicos, com certeza isso pode trazer um prejuízo psíquico”, fala.

Sobre isso, ela indica que os pais, apesar de todas as dificuldades, mantenham uma rotina saudável com seus filhos: “que os horários possam ser cumpridos para que a criança não tenha prejuízo do sono, do estudo, da alimentação e do lazer. É importante ela entender que apesar do momento, é possível manter uma rotina saudável, que pode ser flexibilizada um momento ou outro, mas que no geral não pode trocar a noite pelo dia ou comer a qualquer hora, por exemplo”.

Elisabete orienta que os pais chamem os filhos para participar de uma conversa de construção de suas próprias rotinas. “Chama a criança, apresenta as responsabilidades, exponha as situações preocupantes como o tempo excessivo nos eletrônicos, deixa a criança participar e faça junto com ela os combinados da forma mais clara possível. Quanto tempo para cada atividade, tanto os deveres quanto o lazer”.

Lazer

Elisabete Viana chama atenção também para a questão do lazer: “a criança necessariamente precisa ter um tempo de brincadeira. Os pais precisam ficar atentos em que espaço ela está brincando, quais são as possibilidades dentro de casa, qual tempo ela tem para isto ou se ela só fica em atividades escolares e está cansada, sem tempo de brincadeira livre”.

Uma dica é ver o que se pode disponibilizar dentro de casa para a criança ter um espaço de descontração. “Que não sejam os eletrônicos, mas de brincadeira livre, criativa, que permita à criança um tempo para ela. Os eletrônicos contribuem de alguma forma, mas também podem gerar prejuízo no sentido de não quererem mais conversar, estar na companhia de pessoas e brincar. A criança precisa de espaço para fantasia, imaginação e liberdade”, declara.

Limitar os eletrônicos

A profissional fala que os estímulos cerebrais das luzes, imagens e movimentos constantes dos equipamentos causam muita ansiedade na criança. “Ela precisa intercalar com outras atividades que não possuem estes estímulos para fazer outros tipos de construções e sinapses cerebrais”. Caso contrário, “pode ter um quadro de ansiedade, dificuldades de interação social, querendo ficar mais sozinha, isolada. Dependendo da quantidade de tempo que ela fique conectada, pode trazer um quadro de compulsão”, afirma.

Ela ainda indica a leitura como grande aliada na formação dos pequenos. “A linguagem dos eletrônicos é muito rápida e com textos curtos, com um comando mais simples de links e hiperlinks. Com o uso excessivo, a criança pode desenvolver intolerância e indisposição com a leitura, ficando com dificuldade de interpretação de texto quando precisar ler algo mais longo, que exige raciocínio e interpretação, prejudicando até a vida escolar da criança”, esclarece.

Fique atento aos sinais

Segundo Elisabete Viana, os pais devem estar atentos e procurar um profissional a partir do momento em que o comportamento do filho esteja mudando a ponto de prejudicar a rotina, como dificuldades na alimentação, no sono ou rendimento escolar. “Se a criança apresentar um quadro depressivo, estiver triste, perdendo apetite ou sono, acordando de noite ou com rendimento escolar caindo, são sinais de que a criança está pedindo socorro. Precisa de uma aproximação, um olhar mais cuidadoso”, alerta.

Fortalecimento dos vínculos familiares

Ela também cita como importante a aproximação dos pais neste momento. “Estão todos muito tensionados, preocupados, tristes e as crianças com crise de ansiedade, algumas com fixação na morte, medo de perder a mãe ou pai”, relata.

A sugestão da psicóloga é um fortalecimento de vínculos afetivos em casa, muita conversa, além de evitar que os jornais diários e a atualização do número de vítimas estejam o tempo todo ligados. “É preciso tentar fazer o ambiente ser mais tranquilo, de acolhimento, para que a criança se sinta à vontade para se abrir”.

Luto das crianças

“As crianças que vivenciaram um luto precisam ser acompanhadas por um profissional da saúde, para que eles consigam elaborar a perda principalmente de um vínculo muito próximo, que eles conviviam, como irmãos, pais, avós”, explica.

Elisabete afirma que é necessário que a criança compreenda o que é a morte, qual é o significado disso pra sua vida e elabore o luto de alguma forma, ficando com as memórias boas, entendendo que não há nada que se possa fazer, que é nossa condição humana e que uma hora precisamos nos despedir das pessoas. “Se ela apresenta alguma dificuldade de elaborar, é necessária a ajuda de um profissional”, finaliza.

Foto: Reprodução/Internet