Reforma tributária trará aumento de impostos e perdas para os municípios, afirmam especialistas

28/07/2020 - Câmara Municipal de Fortaleza

Conforme análise publicada pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), as duas propostas, além de dar fim à guerra fiscal, reduzem litígios, simplificam e barateiam a cobrança e o pagamento de tributos.

O Governo Federal apresentou ao Congresso Nacional um projeto de lei que cria a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), com alíquota de 12%, em substituição ao Programa de Integração Social (PIS) e à Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins). O texto corresponde à primeira etapa da reforma tributária pretendida pelo governo federal que deverá modificar, num segundo momento, a cobrança do Imposto de Renda. O Congresso Nacional, por sua vez, desde o ano passado discute duas propostas que alteram o sistema tributário brasileiro.

A proposta 45/19 da Câmara dos Deputados prevê a substituição de cinco tributos (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) por um único, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Já a do Senado, a PEC 110/19 unifica nove tributos (IPI, IOF, PIS, PASEP, COFINS, Salário-educação, CIDE-Combustíveis, ICMS e ISS) no Imposto Seletivo Federal. As duas PECs estão sendo analisadas por uma comissão mista de deputados e senadores.

O projeto enviado pelo Governo estabelece que a CBS será apurada e recolhida pelas empresas mensalmente, e incidirá sobre operações com bens e serviços no mercado interno e em importações. A base de cálculo será a receita bruta auferida pela empresa em cada operação, excluindo o ICMS, o ISS, a própria CBS e descontos incondicionais indicados no documento fiscal. Assim como ocorre com o Imposto sobre Valor Agregado (IVA), presente em muitos países, cada empresa só paga a CBS sobre o valor que agrega ao produto ou serviço.

Tributos municipais

O secretário de Finanças de Fortaleza, Jurandir Gurgel, que participou, nesta segunda-feira (27), de uma live promovida pela Comissão de Estudos Tributários da OAB sobre o tema – “A situação pós Covid-19 e a Reforma Tributária: Como ficam os tributos municipais”, afirma que tanto o Governo Federal como o Congresso estão propondo a simplificação e unificação de impostos e não uma reforma tributária.  “Tanto que as PECs que apresentadas pelo Governo, Câmara e Senado extinguem uma serie de tributos e consolidam as bases em três novos impostos”, avaliou

Para Jurandir, a justificativa para a apresentação das PECs, que a simplificação e unificação farão o país crescer, também é questionável. “O Brasil tem questões estruturais e as fontes de crescimento são bem outras. Podemos citar as consagradas: melhoria da poupança; a melhoria do aspecto tecnológico e da educação, entre outras condicionantes. Se não tiver uma ação governamental mediante uma política tributária que preserve a extinção dos impostos progressivos com uma política regressiva de gastos, isto é, cobrar de quem tem mais e destinar mais para quem tem menos, não teremos uma reforma justa,” avaliou.

Com relação aos tributos municipais, ele acredita que as propostas ocasionarão um aumento da carga tributária. “As propostas do Congresso estimam uma alíquota de 25% e o que se tem posto é que não deverá haver diferença na cobrança dos impostos entre bens e serviços. Isso certamente vai trazer aumento da carga tributária principalmente para o setor de serviços. A proposta do Governo, segue o mesmo molde das do Legislativo, aglutina dois impostos definindo uma alíquota menor, de 12%”.

Ele observa que a Associação Brasileira de Secretários de Finanças das Capitais (ABRASF) apresenta o projeto Simplifica que propõe que as mudanças sejam efetuadas nas matérias infraconstitucionais. “A verdadeira revolução em termos de melhoria na tributação do consumo não é juntar ISS, ICMS, PIS, Cofins, e IPI num IBS e sim unificar os atuais 27 ICMS num ICMS Nacional e os 5.570 ISS em um ISS Nacional, além de aprimorar o IPI como imposto seletivo, unificar o PIS e os COFINS num Contribuição sobre Valor Adicionado (CVA) federal e prever a desoneração da folha de pagamento”, propõe.

O professor Mestre Francisco José Gomes que também participou da live, destacou que a carga tributária brasileira representa 33,3% do PIB do país e do total da arrecadação, apenas 6% chegam aos municípios, os estados ficam com 25,7% e o Governo Federal com 66,4%. “Hoje a arrecadação maior incide sobre bens e serviços, setor que as PECs atacam. O questionamento é como ficaria a autonomia financeira, pois o Governo Federal continuará com o maior bolo dos recursos, mas quem tem que atender diretamente a população são os Estados e Municípios”.

Sobre a proposta do Governo, entende que a alíquota de 12% com certeza trará um aumento de carga tributária de mais de 200% no valor atual. “O pior de tudo é que a proposta não simplifica nada pois cria diversos regimes no tributo, como para bancos, Zona Franca de Manaus, combustíveis. Portanto, continua a complexidade. O que transparece é que o Governo quer compensar as despesas extras que teve no enfrentamento ao Covid-19”, comentou.

Outra mudança citada pelo professor é a alteração na cobrança do IPTU. Na proposta do Senado o imposto incide somente sobre a propriedade territorial, fazendo uma similitude com o ITR. “Com isso, os municípios deixariam de tributar os imóveis construídos sobre o percentual do terreno e isso trará uma perda muito grande”, concluiu.

Câmara dos Deputados

A proposta apresentada na Câmara dos Deputados pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP) extingue três tributos federais (IPI, PIS e Cofins), o ICMS (estadual) e o ISS (municipal), todos incidentes sobre o consumo. No lugar deles, serão criados um imposto sobre o valor agregado, chamado de Imposto sobre Operações com Bens e Serviços (IBS) – de competência dos três entes federativos.

A proposta, segundo Rossi, busca simplificar o sistema tributário, sem reduzir a autonomia de estados e municípios, que poderiam alterar a alíquota do IBS. A ideia é eliminar a “guerra fiscal fratricida” entre estados e entre municípios, sem reduzir a autonomia dos entes federativos na gestão de suas receitas. O IBS será regulado por lei complementar e composto por três alíquotas – federal, estadual e municipal. “Para o contribuinte, será um único imposto, mas para os entes é como se cada um tivesse o seu próprio imposto, pois terão autonomia na fixação da alíquota”, afirmou Baleia Rossi.

Senado Federal

No caso da PEC 110/2019 do Senado, mais impostos são consolidados e os prazos previstos são mais céleres: seis anos para extinção de antigos tributos e dez anos para a conclusão da partilha. Essa proposta constitucional tem o mesmo conteúdo do substitutivo da Proposta de Emenda Constitucional nº 293/04, relatada pelo ex-deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), que estava pronta para ser votada em comissão em 2018.

Conforme análise publicada pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), as duas propostas, além de dar fim à guerra fiscal, reduzem litígios, simplificam e barateiam a cobrança e o pagamento de tributos, mas não resolvem “o problema da injustiça tributária, porque mantêm o caráter regressivo do sistema tributário, evitando tributar de modo mais expressivo a renda e o patrimônio.”

Outras propostas

Além das PECs 45 e 110, há outras propostas tramitando no Congresso Nacional. Esse é o caso da Emenda Substitutiva Global 178/2019 assinada pelos partidos da oposição na Câmara (PT, PCdoB, PDT, PSB, PSOL e Rede). O documento prevê tributação da renda, da propriedade e da riqueza, das transações financeiras, de bens e serviços, da folha de pagamentos, e cria novas formas de arrecadação como a tributação ambiental e a tributação do comércio internacional.

Outra proposta de emenda constitucional é a PEC 128/2019, de autoria do deputado Luís Miranda (DEM-DF) que “altera o sistema tributário nacional”. A proposição ainda aguarda votação de admissibilidade na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara. Se aprovada irá à comissão especial e poderá ser apensada à proposta em discussão.

Foto: José Cruz/Agência Brasil