Conselho Tutelar de Fortaleza já recebeu 640 denúncias de violências contra crianças e adolescentes na quarentena

06/07/2020 - Câmara Municipal de Fortaleza

A maior parte das denúncias, segundo o Conselho, é de negligência

Em pouco mais de três meses de isolamento social devido à pandemia de Covid-19, o Conselho Tutelar de Fortaleza recebeu, entre os dias 19 de março e 2 de julho, 640 denúncias de violências e violações de direitos contra crianças e adolescentes na Capital. A maior parte dos registros relatados envolveu negligência (293), acompanhamento familiar (79), maus tratos (68), situação de rua (57), conflito familiar e/ou comunitário (41), violência física (34), violência sexual (25) e vulnerabilidade social (23). A maioria, nas regionais 5 e 6 da Cidade.

As denúncias acompanham uma preocupação que ganhou relevância nacional após a divulgação, pela Agência Brasil, de dados do estudo Primeira Infância para Adultos Saudáveis. A pesquisa foi coletada no Ceará antes da pandemia de Covid-19 e constatou que 73% dos entrevistados acreditam que castigos são necessários para educar crianças e adolescentes, enquanto que 49% consideram palmadas mais eficientes e, 25%, gritos.

À Agência Brasil, a diretora-assistente do Instituto de Saúde, Sônia Venâncio, responsável pela pesquisa, disse: “A criança está o tempo todo com os pais, com as escolas fechadas. A gente tem que levar em consideração que é uma situação de estresse para famílias, para cuidadores. Muitos deles estão vivendo situação de isolamento, tendo que lidar com questões financeiras, com a crise que estamos vivendo. Precisamos pensar que a criança pode estar exposta a um ambiente em que cuidadores estão estressados e que podem, eventualmente, lidar com essa situação utilizando mais esse tipo de disciplina punitiva”.

Das denúncias gerais recebidas pelo Conselho Tutelar de Fortaleza, a maior parte envolvia meninas na primeira infância, ou seja, entre zero e seis anos de idade.

Proteção por lei

Crianças e adolescentes têm, pela Lei 13.010/2014 (a Lei Menino Bernardo), o direito de serem educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto, pelos pais, integrantes da família, responsáveis, agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou qualquer outra pessoa encarregada de cuidar deles, tratar, educar ou proteger.

Outras violências

Coordenadora da Rede Aquarela, programa municipal vinculado à Fundação da Criança e da Família Cidadã (Funci), Kelly Meneses ressalta que, para além desses tipos de violência aos quais estão mais expostas as crianças e os adolescentes durante o isolamento social, a violência sexual também preocupa e deve alertar a todos. Segundo a Funci, chegaram à Aquarela entre março e junho deste ano, pela Delegacia de Combate à Exploração da Criança e do Adolescente (Dececa), 159 novos casos de vítimas de abusos e exploração sexual.

“A gente achou que, durante a pandemia, teria um número bem menor (de novos atendimentos). E não teve”, disse Kelly, lembrando que considerava que o medo da contaminação pelo novo coronavírus e a dificuldade no acesso à delegacia devido às restrições de circulação poderiam impactar. Normalmente, a Aquarela atende a uma média de 50 casos mensais na Dececa. Na quarentena, apesar de redução, essa média tem sido de 30.

Sem especificar as características dos casos que chegam com mais frequência ao programa pela delegacia, Kelly falou sobre a preocupação com os casos de violência sexual intrafamiliar neste período. “Na maioria dos casos de violência sexual, o agressor é um membro da família”, afirmou. E, geralmente, segundo a profissional, essas violências são percebidas no ambiente escolar. “Uma vez que a criança está reclusa em casa, não tem mais essa socialização, não tem outras figuras que observem”, disse.

Contudo, além dessa, a profissional chama atenção para a violência sexual no ambiente virtual. “Os agressores utilizam uma técnica chamada de ‘comunicação ludibriante’”, disse Kelly. Segundo ela, essa comunicação é lenta, resultado de uma construção que estabelece vínculos de confiança, inclusive, entre agressor e vítima. “Os pais precisam estar atentos a quem são as pessoas que estão convivendo, interagindo virtualmente com seus filhos”, disse.

Denuncie

  • Você pode denunciar casos de violência e violação de direitos contra crianças e adolescentes ao plantão dos conselhos tutelares de Fortaleza clicando aqui.
  • Também pode recorrer à Dececa pelo número 3433-9568. A delegacia fica na rua Soares Bulcão, s/n, no bairro São Gerardo.
  • Além disso, pode discar 100 para acionar a Secretaria de Direitos Humanos do Governo Federal. O serviço funciona 24 horas

Reportagem: Luana Severo

Foto: Divulgação Prefeitura de Fortaleza