Estresse sem tratamento pode ocasionar sérios danos ao organismo, diz especialista

27/09/2021 - Câmara Municipal de Fortaleza

A melhor forma de lidar com tudo isso e prevenir transtornos relacionados ao estresse é conversando, compartilhando as preocupações para buscar formas de amenizá-las

Diversos estudos realizados mostram que desde março de 2020, quando teve início a pandemia por covid-19 no mundo, a saúde mental das pessoas acabou sendo afetada devido à mudança brusca de rotina. Segundo estudo realizado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e publicado pela revista The Lancet, os casos de depressão aumentaram 90% e o número de pessoas que relataram sintomas como crise de ansiedade e estresse agudo mais que dobrou.

Entre os sintomas que podem agravar o quadro de saúde podem ser citados: comportamentos ansiosos e depressivos, como angústia, vontade de se isolar, desânimo, irritabilidade, insônia, além dos sintomas físicos como pressão no peito, taquicardia, sudorese e dor de cabeça. Há casos de pacientes que afirmam sentir os mesmos sintomas relacionados ao coronavírus mesmo sem ter sido diagnosticados com Covid-19. A melhor forma de lidar com tudo isso e prevenir transtornos relacionados ao estresse é conversando, compartilhando as preocupações para buscar formas de amenizá-las.

Para o professor do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará (UFC), João Ilo Coelho Barbosa, doutor em Psicologia pela Universidade Federal do Pará (UFPA), estresse não é uma doença. “A palavra estresse vem da física e quer dizer exatamente aquele momento anterior ao rompimento de um material, ou seja, um estado de tensão máximo de um material pode ser uma barra, um vidro, um cimento, qualquer coisa assim. Também é um termo usado na psicologia e na linguagem comum para dizer que a pessoa está no limite, prestes a se romper”, compara.

Diz que numa situação estressante as pessoas vão ter reações autonômicas, ligadas ao próprio corpo ou ligadas ao pensamento, principalmente, a ansiedade, que se dá na forma física, com liberação de adrenalina ao corpo. “A pessoa vive situações de perigo real, pode suar as mãos, ficar trêmula, pálida e mais preparada para fugir ou enfrentar a situação. Isso é uma situação de estresse provocada por uma coisa pontual, quando acontece algo de imediato”, ressalta.

O professor observa que em caso de continuidade de situações estressantes, a pessoa pode ter outra reação, que ocorre mais a longo prazo, produzido por um hormônio chamado cortisol. Destaca que a função do cortisol é diminuir a quantidade de adrenalina, mas quando ele é liberado frequentemente pode trazer uma série de danos e prejuízos ao organismo, pois vai afetando e sobrecarregando outros órgãos. “Esse estresse que produz ansiedade pode complicar outros quadros, como depressão e outros transtornos de ansiedade. O estresse ou as situações estressantes podem contribuir para prejudicar quem já tem algum transtorno”, avalia.

João Ilo opina que o estresse pode ser um fator precipitador, mas ele não é a causa de uma depressão, que segundo ele, é causada por outros fatores até biológicos, ou ligados ao histórico das pessoas. Com relação a tratamentos, diz que existe o medicamentoso, em caso de um nível muito alto de estresse, “poderia até usar um ansiolítico e também terapia para a pessoa poder aprender a lidar com a situação, que pode ser a terapia comportamental. Existem estudos a respeito e mostram que funciona. Quanto a prevenção, o melhor é ter uma vida mais saudável, situações menos estressantes e momentos de escape, de lazer, e atividades físicas regulares”, observa.

Para ele, os fatores ambientais estressantes podem se somar a outros problemas de saúde, pois uma pessoa deprimida com situações estressantes pode ficar mais deprimida ainda e sujeita a pensar até em suicídio. “O perigo do estresse constante é mais a longo prazo, ou seja, essa liberação do cortisol pode levar problemas mais crônicos no fígado, gastrite, úlcera, enfim, afeta uma série de órgãos quando isso é constante por longo tempo”, conclui.

Formas de lidar

De acordo com a psicóloga Isadora Dias, o nosso corpo é feito para se autorregular. Ela pontua que uma vez que o estresse acumulado gera descargas nervosas contínuas, o corpo precisa encontrar formas de lidar com isso. “Sendo assim, pode manifestar desde sintomas físicos até os psicológicos: dor de cabeça, alterações de sono, alterações de apetite, alterações no humor, disfunções na articulação temporomandibular, reações gástricas, reações nervosas (incluindo tiques), reações na pele, alterações no curso do pensamento, sintomas de ansiedade, sintomas de depressão e muitas outras possibilidades. Uma vez que são sintomas que, isoladamente, podem significar uma série de outras coisas, a auto-observação e a leitura adequada do contexto de vida pode ajudar a entender se o que a pessoa está passando advém de estresse”, observa.

Conforme Isadora, dependendo da natureza dos sintomas, alguns médicos precisam ser buscados, para tratar das manifestações específicas. Mas entende que a mudança no estilo de vida é essencial. “Infelizmente o estresse, na nossa sociedade, se tornou uma cultura. Faz parte da normalidade, pois sempre as pessoas estão correndo, atrasadas, apressadas, atarefadas… É preciso disposição para fazer modificações nos valores que sustentam a vida, pois o excesso de trabalho, por exemplo, pode estar escondendo outras carências, faltas afetivas, dificuldades no relacionamento familiar,” avalia.

Na sua visão esse estado psicológico pode ser prevenido, a partir da mudança de cultura, que começa por cada um de nós. Comenta que a saúde precisa ser vista como necessidade humana e social, de forma que rir, ter momentos de lazer, hobbies, praticar atividade física, ter amigos e tantas outras possibilidades de equilíbrios do estresse precisam ter um lugar reservado no dia a dia e não apenas quando sobrar tempo, sob risco de não sobrar”.

Desafio

Já a psicóloga Kaliny Oliveira argumenta que a pandemia e pós-pandemia de covid-19 têm sido um grande desafio, pois se trata de um evento potencialmente estressante, considerando as medidas de prevenção e contenção da doença, bem como seus impactos na rotina, economia e sociedade. “Não menos relevante é o impacto na saúde mental, tendo em vista as alterações emocionais, cognitivas e comportamentais características desse período.

Segundo a psicóloga, a reação ao estresse é uma atitude biológica necessária para a adaptação às situações e ocorre na vida de todas as pessoas. No contexto da pandemia, ela frisa que alguns dos principais estressores estão relacionados à duração da quarentena, ao distanciamento social, à frustração e ao tédio, bem como ao acúmulo de tarefas. “Entre os principais sintomas emocionais os mais comuns são a irritabilidade, a incapacidade de se concentrar, sentir-se excessivamente cansado, insônia e tensão. Já os físicos incluem a boca seca, taquicardia, dificuldade em respirar, dor de estômago, dor de cabeça, sudorese, tensão muscular, entre outros”, cita.

O indivíduo fica sobre estresse quando percebe as situações e os eventos como ameaçadores, compreendendo as três Necessidades Psicológicas Básicas (NPB), que são inatas, universais e de valor evolutivo aos seres humanos: o “relacionamento” ou pertença, de se sentir aceito e compreendido pelos outros; a “competência”, de se sentir no controle da situação e suficiente para gerenciar desafios e cumprimento de metas e objetivos e a “autonomia”, de manifestar suas ações ou crenças, de ser capaz de iniciar tarefas ou tomar decisões e assumir as consequências do próprio comportamento. “Com a percepção de ameaça ou desafio a essas três necessidades, as pessoas ficam vulneráveis ao estresse, pois sua capacidade de autorregulação é desafiada”, salienta.

Ela ressalta que é importante estar bem consigo mesmo, respeitar seus próprios limites, não levar tarefas e questões do trabalho para casa e para a vida pessoal. “As pessoas devem administrar seu tempo, cuidar das relações interpessoais, definir tempo de ócio, investir no autoconhecimento, ter relacionamento de múltiplo apoio, especialmente em situações de crise. Também serão fortes aliados a atividade física regular, lazer, técnicas de respiração, relaxamento, alimentação saudável, manter vínculos de amizade e buscar experiências que goste”, conclui.

Foto: Agência Brasil