Covid-19: é preciso dar passos lentos na flexibilização para evitar segunda onda, avisa infectologista

21/07/2020 - Ana Clara Cabral

Dificuldade na realização de testes PCR em larga escala contribui para uma flexibilização ainda mais lenta, de acordo com o consultor em infectologia da Escola de Saúde Pública do Ceará

Movimentação de pessoas nas ruas durante pandemia corona vírus

Fortaleza está atualmente na fase 4 do plano de retomada, com o funcionamento do comércio, restaurantes abertos para almoço e no período noturno, barracas de praia recebendo a população para o lazer, atividades religiosas com 100% de sua capacidade, dentre outros setores. Mesmo com uma flexibilização lenta e responsável, pessoas têm demonstrado medo de retornar à vida normal.

Um exemplo foi o citado na matéria sobre o adiamento do retorno das aulas presenciais. Na ocasião, Darllene Santos disse preferir que sua filha de 9 anos volte ao colégio. apenas, após a descoberta da vacina. “Me assusto com a proporção dos casos. Se não tiver outro jeito, que minha filha perca o ano escolar. Prefiro que ela perca o ano do que a vida”, disse.

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Quando perguntado sobre o assunto, o consultor em infectologia da Escola de Saúde Pública do Ceará e médico infectologista do Hospital São José de Doenças Infecciosas, dr. Keny Colares, citou o exemplo de Israel. O país viveu um isolamento rígido entre março e maio, mas a rápida reabertura feita após os números chegarem a praticamente zero fez com que uma nova onda ainda maior acontecesse.

Segundo dr. Keny Colares, o novo crescimento da curva em Israel ocorreu principalmente após a liberação das aulas presenciais. “A maior preocupação é de haver um estouro de casos e passarmos novamente pelo que passamos em maio, com grande quantidade de internações, muitos casos graves e mortes. Por esse motivo as atividades presenciais estão sendo retomadas lentamente em Fortaleza”, explicou.

Ele ainda justificou: “estamos pisando em um terreno desconhecido e em passos lentos testamos a flexibilização para saber se é seguro. Se de repente voltar a ter um rápido crescimento do número de casos, teremos que voltar atrás no isolamento. Quanto mais rápido a gente aderir às medidas de reabertura, maior o risco de esbarrarmos em uma piora da situação”.

Que grau de flexibilização conseguiremos atingir até que surja uma vacina?

De acordo com o infectologista, o avanço deve ocorrer conforme é percebida a melhora da situação. “Vamos fazendo a reabertura até que todas as medidas de segurança não sejam mais necessárias. Se tivermos notícias de que está evoluindo bem, pode ser que em 6 meses voltemos à vida relativamente normal, antes mesmo do surgimento da vacina. Mas isso depende do avanço lento e uma observação muito cuidadosa das consequências”, pontuou.

Dr. Keny comentou ainda que o fato de não termos uma facilidade na realização de exames laboratoriais aqui no Brasil, para uma testagem ainda mais eficiente, como as que ocorrem em países mais desenvolvidos, torna os indicadores da pandemia mais imprecisos. “Depois que se tem a infecção, levamos duas a três semanas para perceber os números de casos e pacientes graves nas UTIs”.

O ideal, segundo ele, era rapidamente fazer o teste “PCR” para qualquer paciente sintomático e, a partir do resultado positivo, testar todos os contatos próximos do paciente, mesmo assintomáticos, e afastar quem der positivo.

Ele frisou: “qualquer decisão de reabertura tomada agora vai mostrar suas consequências boas ou más, só em duas ou três semanas. Essas nossas fragilidades fazem com que os passos precisem ser mais lentos e cuidadosos”.

Foto: Érika Fonseca